Adensamento recorde, falta de espaço e histórias curiosas transformaram Diadema em um dos casos mais emblemáticos do urbanismo brasileiro contemporâneo.
À primeira vista, a imagem poderia ser de qualquer metrópole em expansão.
Ruas intensas o dia inteiro, quarteirões colados entre si e poucas áreas abertas sugerem uma cidade que já não comporta novos vazios.
A expressão “formigueiro humano”, usada recentemente em reportagens internacionais, emergiu desse cenário em que cada metro quadrado tem dono, disputa e função.
É nesse contexto que Diadema, no Grande ABC, se destaca como um dos territórios urbanos mais comprimidos do país.
Segundo o Censo 2022, são 393.237 habitantes distribuídos em 30,7 km², resultando em 12.795 moradores por quilômetro quadrado.
O indicador coloca a cidade na segunda posição nacional em densidade demográfica, ficando atrás apenas de Taboão da Serra, como já publicou o CPG.
Urbanização total e território rarefeito
Praticamente nenhuma área de Diadema permanece sem uso urbano.
De acordo com os dados, o município atingiu 100% de urbanização, condição rara mesmo dentro da Região Metropolitana de São Paulo.
Isso significa que o território inteiro está ocupado, seja por moradias, vias ou serviços essenciais.
Na média brasileira, há cerca de 24 pessoas por quilômetro quadrado.
Em Diadema, o número é quase 500 vezes maior, o que altera a dinâmica de espaço, circulação e planejamento.
Diadema se destaca pela densidade extrema e falta de espaço, tornando-se uma das cidades mais compactas do Brasil e um caso urbano singular
Ainda que o crescimento populacional tenha desacelerado, a pressão não arrefeceu.
Entre 2010 e 2022, houve avanço de 386.089 para 393.237 moradores.
Estimativas de 2024 já apontam população acima de 400 mil habitantes, sem expansão territorial correspondente.
As origens desse adensamento remontam ao período em que a região ainda mantinha características rurais.
Até os anos 1950, predominavam chácaras, sítios e pequenas propriedades.
Com a industrialização do ABC, impulsionada pelas rodovias Anchieta e Imigrantes, fábricas se instalaram e fluxos migratórios se intensificaram.
A emancipação, em 1959, abriu caminho para um ciclo de crescimento rápido.
Entre 1960 e 1980, a população saltou de cerca de 12 mil para 228 mil pessoas.
Esse processo originou uma malha urbana adensada, formada muitas vezes sem planejamento prévio e com ocupações em terrenos complexos.
Relevo íngreme, limitações físicas e ocupações espontâneas
Grande parte do território diademense possui características geográficas desafiadoras.
Registros técnicos apontam que aproximadamente 80% da área apresenta forte inclinação, dificultando obras de infraestrutura e abertura de novas vias.
Com o tempo, a ocupação avançou para encostas, fundos de vale e bordas da represa Billings.
Levantamentos de meados dos anos 2000 indicavam a existência de 207 núcleos subnormais, muitos surgidos ao longo de três décadas.
A soma de solo caro, pouco acessível e alta demanda por moradia expandiu ciclos de autoconstrução e adensamento periférico.
Curiosidades que ajudam a entender a cidade
Diversos aspectos pouco conhecidos ajudam a explicar por que Diadema se tornou símbolo do adensamento brasileiro.
O nome tem origem mineral, associado ao “diadema de ouro”, referência antiga à camada de minério encontrada na região.
O município abriga um dos maiores cemitérios verticais da América Latina, solução adotada para lidar com a falta de espaço.
Políticas pioneiras de redução de homicídios, especialmente no início dos anos 2000, projetaram a cidade nacionalmente em estudos de segurança pública.
O hip hop ganhou casa oficial antes de muitas capitais, graças a centros culturais que apoiaram batalhas, oficinas e formações.
O zoológico municipal, criado em 1964, foi um dos primeiros equipamentos do tipo na Grande São Paulo e marcou gerações.
Áreas de antigas pedreiras deram origem a bairros inteiros, convertidas em loteamentos que, mais tarde, se integraram à malha formal da cidade.
Verticalização intensa e políticas habitacionais
A compressão territorial levou Diadema a adotar soluções mais verticais.
Documentos oficiais classificam o município como “uma cidade adensada”, conceito que norteia mudanças no Plano Diretor.
O conjunto “Diadema O”, com torres de até 21 andares e mais de 400 unidades, ilustra essa diretriz.
Projetos recentes aprovados pela Câmara Municipal autorizam quase 900 novas moradias de interesse social.
As intervenções costumam ocupar áreas remanescentes ou locais de reassentamento de famílias que viviam em faixas de risco.
Mobilidade tensionada e integrações regionais
Não é apenas a moradia que sente os efeitos do adensamento.
A mobilidade urbana é um dos pontos de maior pressão.
Gargalos viários frequentes, somados ao trânsito de cidades vizinhas que atravessam Diadema diariamente, tornam os deslocamentos mais lentos.
Boa parte da população depende de trajetos intermunicipais para acessar empregos, universidades e serviços especializados.
Medidas recentes tentam aproximar moradia, comércio e transporte, incentivando uso misto do solo e rotas mais curtas.
Sustentabilidade, lazer e reconhecimento externo
Apesar da densidade extrema, iniciativas de qualificação urbana começam a ganhar visibilidade.
Projetos apresentados em eventos do ONU-Habitat mostram esforços locais para melhorar espaços públicos e redes de convivência.
O título de “Cidade Sul-Americana do Esporte”, recebido em 2024, reforçou programas de atividade física sobretudo em bairros periféricos.
Com pouco território disponível, as ações de reurbanização e criação de áreas de lazer tornam-se parte essencial da política urbana.
Numa realidade em que cada lote é disputado e cada obra exige soluções engenhosas, uma questão permanece aberta: qual caminho Diadema deve priorizar para equilibrar densidade, infraestrutura e qualidade de vida nos próximos anos?
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